18 de junho de 2013

il tombe des cordes

foto: carlos silva

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IL TOMBE DES CORDES

Há sol a mais entre o girar quando os olhos assim semicerrados
atentam no pélago de cada coisa radiosa
- um fragmento de barro, a rede ao lado da água, a velhice do poço, de um sótão, uma claraboia -
a potência do sal trespassa os búzios nos olhos
porque quando se é inteiro não se tem que amar uma só realidade
da mão ao punho são muitas estações onde o toque naufragado se espraia
e se comove a cada sulco da memória singular

a roda será sempre a mesma que reconhecemos da carne exposta
sem que ela interrogue o seu desígnio circular
tal como da arte não questionamos seus alinhamentos
ou do infinito seu bago de ouro, por mais pequeno
aprendemos que nas cordas os laços são expansivos
que nas combinações contadas e definitivas se perece internamente
mesmo reconhecidas as pontas, a ferrugem, o ferro
- a cruentação do enforcado, os ossos de Seth, as presas do chacal –
mesmo o ferro negado do templo
perece-se intimamente:
a corda é sempre corroída, as pontas dos dedos, o terno ângulo simétrico aceso que aguarda
ou a âncora imersa por trás das atlânticas pálpebras
quando somos apenas nós quem ousa esperar e oxidamos

cada coisa em si é maior, é diante do seu incêndio salubre e autêntico que nos debruçamos
e ficamos à escuta, como se por pararmos algo na roda arvorasse os crânios - monárquicos celestes, humanos – pela grande corda em tensão que fecunda a terra
nada no círculo arrasta o milhar de formas outras,
um voo de constelações diferentes, um sorriso luminoso, ou as cordas serem escassamente chuva

as raízes visíveis com que se atam os ventos ou o coração oval no meio da caverna
ou a cabeça fundeada no navio que predissera tudo
e as coisas continuam ali
activas
e a sua linguagem é-nos ilegível como um quarto sombrio

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constanza muirin

 

7 de junho de 2013

a teia


foto: carlos silva

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a teia



fina e tenebrante
a luz,
é com as mãos que prendo
vasta, a guardadora de tempo
no teu útero,
− a teia.

de braços separados
de um corpo
tece mecânica e imprecisas as horas
neptunos e
halo, findo e esparso
de um tempo, a memória
no corpo desmembrado que tece, fina
a duração das horas,

submersão e chuva
ah, inquieta e devassa,
perscrutante, a aranha
cose e cospe
matéria interior do teu corpo
no útero-
-devassidão, 

esquinas de um tempo
na humidade ligeira
sal e o mar da areia −
− poeira
aranha e precipício.

alagadiços,
a meia luz, os tempos,
Vasta, a luz
que se entorpece
na ravina,
cose e cospe,
água e pó, fogo e vidro
celulares, átomos e perecíveis
de seda
a vegetação dos astros
no microscópico labor da boca seca ao útero
fiandeira,
palavras de poesia
e rainha,

é com os olhos que cavo
hoje
funda, a precipitação dos meus líquidos
nos teus
de cada dia −
− a chuva,
nos dais hoje,
no teu útero,
e
malabarismo de pernas e patas,

predadora
a nua e dureza
matéria de fotografia
animal,
aranha e mulher,
explosiva e exposta
na sobrevivência
de luz de cristal decantado
espiral e labirinto,

e agora morres,
teia de pó e ternura
aranha
de todos os tempos
trama
poeira e poesia.

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